Por dia, cerca de 30 pessoas são presas por roubo de carga no estado do Rio. A reboque desse crime, vem outro, o de receptação das mercadorias que são levadas, cuja punição é muito mais branda. Levantamento feito pelo EXTRA mostra que 8 em cada 10 presos em flagrante pelo delito (84%) este ano estão em liberdade. A maioria deles foi solto em até uma semana.
A pesquisa foi feita com base nos presos pela Delegacia de Roubos e Furtos de Cargas (DRFC) em 2016 (até a última quinta-feira). Foram 75 capturados — 12 estão atrás das grades (tiveram a prisão preventiva decretada) e 63 conseguiram liberdade.
Desse total, 43 foram soltos na Audiência de Custódia, dois pagaram fiança e outros 18 foram soltos pelo juiz do processo. A receptação simples tem pena de um a quatro anos de reclusão e a qualificada, três a oito. No primeiro caso, é possível que o réu tenha direito à suspensão condicional do processo, no qual sequer é condenado.
O fato do crime de receptação ser sem violência também contribui para que os suspeitos possam responder o processo em liberdade. Além disso, na maioria dos casos, os juízes consideram que a prisão dos suspeitos não é necessária.
Um projeto de lei já aprovado na Câmara dos Deputados prevê o aumento da pena para os delitos. Ainda é preciso aprová-lo no Senado. A receptação simples passaria a ter condenação de dois a oito anos, e a qualificada, de três a dez.
A juíza Marcela Assad Caram Januthe Tavares, coordenadora das Audiências de Custódia, explica que não é razoável manter o suspeito preso durante o processo quando, no fim dele, a sentença não o colocará atrás das grades.
— Muitas vezes, também não temos informações sobre a carga roubada na Custódia. Temos poucos dados e ficamos sem subsídios. Não podemos piorar a situação do custodiado por suposição — explica a magistrada.
Exceções à regra, na última quinta-feira dois suspeitos presos por receptação qualificada — Diego Quintela Ventura Lima e Diego Pereira da Costa — foram mantidos atrás das grades pela juíza Sabrina de Borba Britto, da Audiência de Custódia. Ambos estavam com parte de uma carga de celulares avaliada em R$ 8 milhões, roubada no fim de semana passado. Em sua decisão, a juíza afirma que apesar de receptação ser um crime sem violência, “incentiva crimes anteriores”, já que a carga apreendida foi produto de um roubo praticado com emprego de diversas armas de fogo.
Delegado titular da Delegacia de Roubos e Furtos de Cargas, Maurício Mendonça afirma que os criminosos correm o risco de serem pegos porque a punição é branda.
É possível diminuir o roubo de cargas combatendo a receptação?
É complicado, com a legislação atual. A receptação fomenta o roubo. As cargas não são roubadas para consumo dos ladrões, mas sim porque eles sabem que haverá alguém para comprar as mercadorias.
Seria necessário endurecer a punição à receptação?
Acredito na efetividade das penas de caráter administrativo, como, por exemplo, cassar o CNPJ ou alvará das empresas que forem flagradas comprando produtos roubados. Já há um projeto de lei para isso. A maioria dos nossos presos em flagrante por receptação são comerciantes que atuam regularmente.
E não seria necessário também aumentar a pena pela receptação?
Defendo que haja uma agravante para a receptação de carga roubada apenas. Hoje, eles (ladrões) preferem correr o risco de praticar o crime pois, se forem pegos, a punição é extremamente branda.