Investigada pelo TCU, Concer também falha na manutenção da pista atual
Fonte: O GLOBO
RIO – Não bastasse a crise financeira que afeta a economia e os serviços públicos no Rio de Janeiro, 2017 começa com mais uma importante obra paralisada no estado: ao contrário do esperado, não há perspectivas para o término da obra da Nova Subida da Serra (NSS), que liga a capital a Petrópolis. Está confirmado: o novo trecho da BR – que já deveria estar pronto, substituindo um traçado sinuoso e obsoleto, de 1928 – tem indícios de irregularidades graves e não será concluído no curto prazo.
A decisão, do último dia 19, será encaminhada à Comissão de Orçamento do Congresso pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Após prazo legal de quatro meses, o TCU manteve as conclusões de sua auditoria, não aceitou explicações preliminares da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) e proibiu a Concer (Companhia de Concessão Rodoviária Juiz de Fora-Rio), responsável pela obra, de receber, até serem feitas readequações, dinheiro público.
Na prática, isso significa que os usuários da Concer, que pagam hoje de R$ 12,40 (carros de passeio) a R$ 74,40 (longos caminhões com reboque) cada vez que passam pelas três praças de pedágio, continuarão dependendo, por tempo indeterminado, da precária estrada velha, cuja manutenção não é mais a mesma. Mesmo assim, não há sinal de redução no valor do pedágio, reajustado em outubro passado. Nos feriados, cerca de 270 mil veículos passam pelos pedágios da Concer.
Rachaduras, desníveis e buracos que surgem nas placas de cimento originais passaram a ser cobertos com asfalto comum – em vez de serem substituídas por novas placas, providência mais cara e demorada. As emendas deixam a pista irregular, tornando a sucessão de curvas ainda mais perigosa. Sem contar os riscos e transtornos impostos aos motoristas pelos canteiros de obras abandonados.
– A pavimentação está muito ruim, e a minha percepção é que houve piora na manutenção e no policiamento desde que começaram a construir a estrada nova, há dois anos, avalia a headhunter Cristina Bernardes, que mora em Petrópolis e trabalha no Rio às quartas e quintas-feiras. – Estamos pagando um pedágio muito caro para o benefício recebido.
Motorista desde os 18 anos, Cristina diz que dirigir na Rio-Petrópolis é arriscado para quem não conhece a estrada, sobretudo por não comportar caminhões, que tomam as duas faixas nas curvas.
Justamente por isso, o transporte de carga, que hoje sofre restrições de dias e horários na subida da Serra, também seria beneficiado pela construção dos novos 20 quilômetros duplicados, com pistas mais largas e planas, e um túnel de cinco quilômetros de extensão.
– A notícia de interrupção da obra é péssima para o setor, pois esperamos uma solução para esse problema há mais de dez anos. Assim, fica inviabilizado não só o transporte de cargas, mas o de passageiros também, com sérios riscos de acidentes, analisa Francesco Cupello, presidente do Sindicato das Empresas do Transporte Rodoviário de Cargas e Logística do Rio de Janeiro. – São inúmeros os buracos na pista, a sinalização é precária, muretas de proteção estão quebradas e há falhas na iluminação dos túneis. Tudo isso coloca em risco a vida dos motoristas de caminhão e de quem mais precisa transitar pela rodovia.
Além de mais segurança, a nova subida diminuiria o percurso para quem viaja do Rio para Minas e permitiria que o caminho antigo, emoldurado pela beleza do que restou da Mata Atlântica, fosse transformado em estrada-parque, com preservação da flora e da fauna. A execução da nova Rio-Petrópolis, entretanto, está, segundo o TCU, “permeada de irregularidades”.
EM RELATÓRIO, TCU DIZ QUE SOBREPREÇO DA OBRA SUPERA R$ 200 MILHÕES
Em novembro, uma fiscalização do tribunal constatou que apenas 35% do trajeto estavam concluídos – o prazo final era dezembro. Os auditores encontraram outros problemas: sobrepreço na obra, em valores ainda não fechados, mas que ultrapassam R$ 200 milhões; superestimativa de impostos a serem pagos pela concessionária no cálculo do valor do reequilíbrio financeiro do contrato (R$ 62,5 milhões já corrigidos unilateralmente pela ANTT, que teria de abater ainda mais R$ 150 milhões), e projetos básico e executivo deficientes, que precisariam ser refeitos.
O que torna ainda mais complicado o reinício das obras é que o termo aditivo ao contrato com a Concer, de número 12, que prevê investimentos da União de R$ 1,2 bilhão, também está sob exame da corte de contas e pode ser anulado. Pertencente ao Grupo Triunfo, alvo de investigação da Lava-Jato, a Concer não quis falar oficialmente sobre o último relatório do TCU.
Em documentos, a concessionária argumentou que o fato de o governo federal não ter feito os aportes previstos no aditivo nº 12 % –R$ 300 milhões em 2014, R$ 600 milhões em 2015 e mais R$ 300 milhões em 2016 – é a causa do atraso. Alegou ainda não existir sobrepreço nas planilhas, cujos serviços teriam sido apenas orçados, e não executados. Afirmou, por fim, ter crédito junto à ANTT – que o ministro substituto do TCU Augusto Sherman Cavalcanti classificou no último relatório como “pouco verossímil, haja vista a magnitude dos ajustes que terão de ser promovidos pela agência”, em 90 dias.
A parceiros, a Concer tem dito que, acreditando que esses desembolsos seriam feitos, tomou um empréstimo-ponte no BNDES de R$ 180 milhões – hoje, o banco cobra R$ 219 milhões – para tocar as obras, mas teve de paralisar tudo em 2016 por estar em situação de “estrangulamento financeiro”. Alvo também da Justiça e sob risco de perder a concessão, a Concer tem apelado para “uma solução de consenso” que reequilibre financeiramente seu contrato e permita a retomada da tão prometida nova subida da serra.
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